De tão popular, o termo virou gíria. Em São Paulo, coxinha é rapaz engomadinho, versão masculina da patricinha.
O que não faz muito sentido, já que o salgado, de chique, nunca teve nada. Pelo contrário: sempre foi item obrigatório em vitrines de botecos, padarias de bairro e, no máximo, festinhas de família. Só recentemente mudou de status e passou a frequentar cardápios de bufês, restaurantes e bares da moda.
A origem da receita é incerta. Circula na internet uma versão curiosa, que tomou fôlego após ser publicada, em 2000, no livro Histórias e receitas – Sabor, tradição, arte, vida e magia, de Nadir Cavazin, editado pela Sociedade Pró-Memória de Limeira. Reza a lenda, segundo a autora, que o salgado nasceu no século 19, na fazenda Morro Azul, onde a princesa Isabel e o Conde d’Eu mantinham um filho com deficiência mental, que se recusava a comer qualquer coisa além de coxas de galinha fritas. Um belo dia, sem aves à disposição, a aflita cozinheira teria inventado o quitute a partir de sobras, na tentativa de enrolar o patrãozinho. “A história faz parte da tradição oral da cidade e tem sentido. Afinal, por que o Império construiria uma fazenda tão luxuosa, com brasões nos móveis, onde não havia nem estrada?”, Nadir argumenta.
A jornalista e pesquisadora Roberta Malta Saldanha, autora de Histórias, lendas e curiosidades da gastronomia (Editora Senac Rio), não acredita. “A família real se hospedou na fazenda Morro Azul, em Limeira, mas não há registro de que a princesa tenha tido um filho com problemas mentais”, explica. Sem contar que o francês Lucas Rigaud, cozinheiro da trisavó da princesa, d. Maria I, já havia publicado no livro Cozinheiro moderno ou nova arte de cozinha, de 1780, uma receita de “coxas de frangas ou galinhas novas” empanadas e fritas.
Mais adiante, em 1844, lembra Roberta, Antonin Carême chegou ainda mais perto da versão atual da coxinha no livro L’Art de la cuisine française au XIXème Siècle. Seu croquette de poulet (croquete de frango) deveria ser moldado em forma de pera.
Alheio à discussão, o empresário Cássio Piccolo classifica seu boteco, o paulistano Frangó, como divisor de águas na história da coxinha. Aberto em 1987 por Vandecyr Piccolo, seu pai, teria sido o primeiro a eliminar a malfadada estufa para salgados. “Nossos clientes nunca precisaram perguntar se as coxinhas estão frescas. Sempre foram fritas na hora”, orgulha-se. À receita de família, Piccolo acrescentou Catupiry em dose generosa, que escorre à primeira mordida.
Com o passar do tempo, viu-se obrigado a mexer no tamanho do salgado. “Para que as mulheres não sentissem tanta culpa, criei uma versão menor, que fica entre a tradicional e a dos bufês de festa. O problema é que elas acabam comendo mais ainda”, brinca. As grandonas ainda saem, mas menos que as menores. “Contando os dois tamanhos, fritamos 50 mil coxinhas por mês”, Piccolo comemora. Para acompanhar, ele sugere um dos 400 rótulos de cerveja da carta. “Qualquer um mesmo, porque coxinha harmoniza com tudo”, avisa o expert.
Fonte: revistacasaejardim.globo.com